O Outro que Desejamos Ser

Nunca desejámos tanto deixar de ser quem somos. Nunca nos olhámos tanto ao espelho com a sensação de que nos faltava algo, de ter feito outras escolhas. Não sendo propriamente o desejo de felicidade que nos move, mas apenas o simples impulso de não continuar como estamos . A frase que abre o romance (ver abaixo) de David Foenkinos sintetiza algo mais vasto do que o drama privado de um casal: exprime o mal-estar de uma era que deixou de confiar na estabilidade dos vínculos, sejam eles afetivos, profissionais ou identitários. Já não vivemos em função de ideais duradouros, mas de pequenas tentativas de reconfiguração — como se a vida fosse um protótipo contínuo que vamos abandonando a cada falência emocional. “ Nunca antes uma época foi tão marcada pelo desejo de mudar de vida. ” Esse desejo de mudar — de casa, de cidade, de profissão, de corpo, de parceiro, de narrativa — não é sintoma de fragilidade. É um sinal desta época. Um modo de estar onde a separação é menos um evento e mais uma ...