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Ficcionar Mary Wollstonecraft

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Mary Wollstonecraft escreveu a " A Vindication of the Rights of Woman " em 1792, criando uma das primeiras obras em defesa dos direitos das mulheres, tornando-se pioneira do feminismo e num dos grandes nomes da filosofia britânica. Em 1797, dava à luz Mary Shelley, morrendo 11 dias depois. 20 anos depois, Shelley dava-nos " Frankenstein " (1818) , o primeiro grande livro de ficção-científica, e uma das obras mais emblemáticas da literatura inglesa. Ao contrário do expectável, Wollstonecraft não nasceu num berço de ouro, nem foi estimulada a estudar, antes pelo contrário. “ Love and Fury ” (2021) de Samantha Silva usa os 11 dias após o parto para ficcionar um monólogo de Wollstonecraft dirigido à sua filha, “little bird”, dando conta da sua biografia. Não sendo uma obra notável na revelação de factos, nem na interpretação da vida da filósofa, é uma viagem adorável pelo interior da mente, especulada, de Wollstonecraft, que nos permite descobrir a força e acuidade do c...

Dostoiévski: uma vida íntima

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O título afastou-me, “Dostoevsky in Love” (2021), mas algumas críticas ao livro levaram-me a perceber que havia aqui algo mais. Alex Christofi não entrega um livro sobre os romances do escritor, apesar de falar deles, o foco é antes aquilo que aparece em subtítulo, “ An Intimate Life ”, que vai dos amores às obsessões, doenças, humilhações, torturas, e claro, a fé. Mas o que torna esta obra verdadeiramente incontornável é o seu processo de criação. Christofi começa por falar na ausência de uma autobiografia que Dostoiévski quis escrever mas acabou por não o fazer, pelo que Christofi procura exatamente chegar aqui àquilo que poderia ter sido essa autobiografia, ou como lhe chama o autor, "memórias reconstruídas". Para o efeito, faz algo, academicamente nada aconselhável, como ele própria afirma, mas que acaba resultando num trabalho imensamente poderoso. “Dostoevsky in Love” apresenta-se como um pedaço de tecido da vida de Dostoiévski, costurado de forma uniforme e homogéna a ...

Adão e Eva

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Tinha gostado muito de “The Swerve” (2011) , e posso dizer que “ The Rise and Fall of Adam and Eve: The Story That Created Us ” (2017) não me desiludiu, ainda que esteja alguns pontos abaixo em termos de relevância e coesão. O foco deste trabalho é o significado da representação cultural de Adão e Eva desde os tempos da Babilónia. Greenblatt realiza uma viagem impressionante ao longo de 5 milénios, ainda que os pontos altos destaquem 3 grandes autores — Agostinho, Dürer e Milton. Ao longo das páginas ficamos a saber muito do que sabíamos, mas imenso do que desconhecíamos sobre a história e durabilidade do mito. Greenblatt refere-o como o mais duradouro, o que talvez não seja difícil explicar já que se trata de uma história sobre a Origem, mas é também uma história sobre um dos processo centrais da na nossa espécie, o sexo, e por fim, um mito que só pôde ser completamente derrubado em 1859 por Darwin. Greenblatt fez um levantamento sobre as origens do mito, assim como sobre os maiores r...

As Memórias do Livro

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Texto salvo da conta Substack que criei em julho 2023 e apaguei em dezembro 2023. --- Premissa excelente, notável investigação e até um interessante enquadramento ficcional, mas que acaba a falhar na dramatização. “As Memórias do Livro” (2008) procura ficcionar a verdadeira história de sobrevivência, ao longo de 500 anos, do manuscrito “Hagadá de Sarajevo” (1492). O manuscrito regista várias particularidades: é um texto que aborda a visão judaica do mundo, tendo sido por várias vezes salvo da destruição por guardadores judeus, muçulmanos e cristãos; é um livro de iluminuras repletas de representações humanas, imagens proibidas tanto por judeus como muçulmanos; é um livro feito de grande luxo — folhas de velino de pele de bezerro, ilustradas a folha de ouro e lápis-lazúli (ver vídeo de fac simile )— contudo não se conseguiu até hoje identificar quem o fez, desenhou ou encomendou; e por fim, escapou à expulsão dos judeus de Espanha em 1492, escaparia novamente à censura em Veneza no sécu...