O nascer do Oeste americano

A série "American Primeval" (2025), dirigida por Peter Berg, representa uma disrupção dos cânones narrativos e estéticos do género Western. O argumento da série, de Mark L. Smith, oferece uma desconstrução do Western clássico, recusando a glamourização de heróis, pioneiros e mesmo nativos. Explora-se o sofrimento humano, a violência sistémica e as profundas ambiguidades morais que moldaram a expansão para o Oeste americano. 

Com uma escrita arrojada, cinematografia imersiva e performances notáveis, este novo olhar redefine um mundo que tem sido mitificado com base numa imaginário longe da realidade. O trabalho de câmara e fotografia, destaca-se por uma abordagem crua e atmosférica. O uso de paletas de cores frias e sombrias e de enquadramentos sobre a vastidão das paisagens conferem à série um tom introspectivo. A natureza pode ser bonita, mas não deixa de ser mais um elemento hostil que condiciona a vida e as relações interpessoais naquele lugar, recordando "Butcher's Crossing" (1960) de John Williams.

"American Primeval" crítica a violência, mas não deixa de ser um retrato profundamente violento do Oeste. À semelhança do que pudemos ver em "Red Dead Redemption 2" (2018) Rockstar, combina-se a exploração da violência estrutural com uma reflexão sobre o legado colonial e as relações humanas. A sensação de imersão psicológica lembra o videojogo, mas a série vai além, propondo uma crítica mais direta aos heroísmos que Hollywood promoveu durante tantos anos.

Um dos aspectos que mais me surpreendeu foi a forma como abordou o papel dos Mormons na colonização do Oeste americano, expondo os males entranhados numa cultura que, sob o disfarce de espiritualidade, perpetuou atos de extrema violência e profundo autoritarismo. A complexidade, e implicações, desta representação é um enorme ato de coragem de "American Primeval", confrontando aquilo que até hoje tinha sido evitado no entretenimento popular.

Stream: Netflix

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