Super Negligência

Hoffman quer muito que acreditemos que a IA será o trampolim da humanidade. Que não há monstros debaixo da cama — só oportunidades. Mas a crença não basta.

Superagency vende-se como um manifesto tecno-humanista, mas o que entrega é um panfleto corporativo disfarçado de visão ética. Hoffman procura afastar os fantasmas do apocalipse digital, mas ao fazê-lo apaga também os sinais de alarme. O tratamento que dá a obras como 1984 é revelador. 

Mais do que ingenuidade, o forma como Hoffman aborda 1984 revela um perigoso vazio interpretativo. Ao sugerir que Orwell falhou ao não explorar as “possibilidades comunicacionais” dos telescreens, Hoffman transforma um dos símbolos mais densos da opressão moderna num defeito técnico — como se a distopia fosse um erro de design. A frase “the fact that you can be overheard also means you can be heard” ignora o papel central do medo e da vigilância internalizada nos regimes autoritários. Pior: pressupõe que bastaria vontade política para transformar instrumentos de repressão em canais de participação. Esta reinterpretação tecnológica esvazia o sentido ético e literário de Orwell, convertendo o horror da submissão total num apelo otimista à escuta estatal. É um gesto cego, revelador de um autor que não compreende o que está em jogo quando se fala de poder.

Falta aqui densidade histórica, política, antropológica. Falta escuta. Falta mundo. Reid quer ser o anti-Zuboff, o anti-Harari, mas acaba por protagonizar uma super negligência analítica. O livro exalta as promessas da IA, mas sem reconhecer as assimetrias de acesso, os riscos de captura económica e os efeitos colaterais invisíveis. Ignora o facto de que nenhuma tecnologia é neutra — e que a agência que hoje se amplifica é a de quem já tem agência.

Um livro pobre em pensamento. Rico apenas em fé.


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Nota: Este texto foi desenvolvido a partir de uma interação com um modelo de linguagem avançado (IA), usado aqui como interlocutor crítico e ferramenta de estruturação.

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